agosto de 2022

RUBENS BARBOT (1949-2022): ENTRE BORDADOS E MOVIMENTOS, O GESTO HONESTO

Luciane Ramos Silva

 

 

 

 

 

 

 

 

fotos marian starosta
imagem da capa:  Rubens Barbot no espetáculo 40+20, no Teatro Tom Jobim (RJ), em 2011

 

 

 

 

 

 

 

Baila infinito o luminoso coreógrafo, bailarino e pesquisador que lapidou movimentos da vida cotidiana negra e transmutou em arte.  Rubens Barbot vive entre nós!

 

Nascido na cidade de Jaguarão, Rio Grande do Sul, estado de grandes personalidades negras, Rubens Barbosa dos Santos iniciou estudos em dança em Porto Alegre, território de férteis sotaques negros. Rumou para a Argentina no final dos anos 1960, onde frequentou a escola de Ballet Contemporâneo de Buenos Aires. Logo entrou em contato com a cena portenha de aulas de dança, musicais, óperas, shows e toda a efervescência daqueles tempos de contracultura. Lá dançou balés, musicais, coreografou programa de televisão e adentrou o aquecido solo de artes que a cidade oferecia.

 

Sua habilidade como figurinista também florescia à medida que era convidado a confeccionar roupas para os trabalhos nos quais atuou. Esse olhar para a confecção de figurinos e a cena, posteriormente, teria importante lugar em sua escrita criativa.

 

Com a chegada da ditadura militar e seus terrores em solo argentino, Rubens voltou para o Rio Grande do Sul, reencontrou a riqueza das estéticas negras tão fundantes daquelas paragens e lá teceu movimentos criativos durante os anos 1980.

 

 

 

Rubens no espetáculo Solos em Companhia, 2011

 

 

 

A quentura carioca chamou, e o artista rumou para o Rio de Janeiro, onde fundou nos anos 1990 a Cia. Rubens Barbot Teatro de Dança e, posteriormente, o Terreiro Contemporâneo, junto a seu companheiro de vida, Gatto Larsen. O Terreiro é um espaço de resistência cultural e “centro de referência voltado para a pesquisa do gesto, movimento e imagens extraídos de corpos afro-brasileiros com suas histórias corporais e suas raízes africanas, compondo com esse material uma linguagem genuinamente afro-brasileira”.

 

Como resposta afirmativa aos escassos espaços destinados às produções artísticas negras, o Terreiro Contemporâneo de Dança articula pensamentos no campo das diversas linguagens artísticas e seus agentes, para difundir e fazer fruir obras do universo afro diaspórico. Entre residências artísticas, ensaios, reuniões, debates, o espaço tornou-se a um só tempo incubadora e propulsora de ideias. Num total de cinco andares, o prédio localizado no centro do Rio, traz inscritos em suas salas grandes nomes da arte negra brasileira: No andar térreo o Espaço Clyde Morgan;  no segundo andar/mezanino, o espaço Conceição Evaristo; no terceiro, o Espaço Rubens Barbot e no quarto, o Espaço Chica Xavier.

 

 

 

Rubens no bairro Santa Tereza, no Rio de Janeiro, em 2011

 

 

 

Lembro de uma foto memorável, registrada por Gatto Larsen em 2013 onde Barbot repousava levemente em uma grande poltrona, vestindo uma descontraída regata branca e um jeans claro. Na companhia dos ilustres Elísio Pitta e Rui Moreira, cercados por imagens em preto e branco de espetáculos da Cia. Rubens Barbot, celebrávamos a vida e o porvir das artes negras. Hoje, fortalecidos por sua presença ancestral, seguimos celebrando, firmes.

 

A dança-teatro-performance-cinema de Rubens Barbot trouxe outras texturas para o restrito cenário da dança contemporânea carioca levando aos palcos corpos cientes e negramente poderosos.

 

Sua linguagem/filosofia do “gesto honesto”, está grafada em extensa produção artística:

 

2012 – UM RIO, DE JANEIRO A JANEIRO

2011- SOLOS EM COMPANHIA

2010 – 40 + 20

2008 O REINO DO OUTRO MUNDO – ORIXÁS

2006 – QUASE UMA HISTÓRIA

2005 – SUCESSOS NAS RUAS (espetáculo de rua)

2004 – MAMMA ÁFRICA (coletânea)

2002 – CENAS QUE GUARDEI NO BOLSO DA MEMÓRIA

2001- TEMPO DE ESPERA

2012 – ESSE AMOR QUE NOS CONSOME – Filme

2000 – NÃO É MAR, MAS É SALGADO…

1999 – IMAGENS

1998 – TOQUE DUPLO (Double Touch)

1997 – EM PLENO MEIO DIA DA NOSSA NOITE

1996 – TOQUE DE DANÇA (Touch of Dance)

1995 – ELECTRONIZUMBÍ

1994 – LOS ILUSIONISTAS

1993 – DANÇA NANÁ

1992 – TRÊS ESTUDOS COREOGRÁFICOS

1991- MÁSCARAS NEGRAS

1991 – SÓ, UM HOMEM SÓ (reposição)

1990 – SUSPEITO SILÊNCIO

 

Pesquisador do movimento com olhar precioso para o mundo, dançou e criou como  numa batalha. Rubens Barbot e seu legado permanecerão entre nós inspirando e nutrindo a história da dança cênica brasileira.

 

*A cronologia das peças foi extraída do Blog da Cia.
http://ciarubensbarbotteatrodedanca.blogspot.com/

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Luciane Ramos Silva

Luciane Ramos Silva é antropóloga, artista da dança e mobilizadora cultural. Doutora em Artes da Cena e mestre em antropologia pela UNICAMP. Bacharel em Ciências Sociais pela USP. Atua nas áreas de artes da cena, estudos africanos e educação.

A Revista O Menelick 2º Ato é um projeto editorial de reflexão e valorização da produção cultural e artística da diáspora negra com destaque para o Brasil.